sexta-feira, 14 de novembro de 2008

CHER BARAK

Sarkozy pediu a assessores para ser acordado logo que a vitória anunciada pelas pesquisas fosse confirmada. Apenas quatro minutos depois da fala de John McCain admitindo a derrota, uma hora antes de Gordon Brown e duas horas antes de Angela Merkel, o presidente francês assinava uma carta manuscrita ao novo presidente. Ela começava com um “Cher Barak”. Sem o c antes do k. Quem revelou o erro na ortografia do nome de Obama foi o jornal alemão Bild, que escreveu a notícia com o título: “Errado”.
Maldosos, esses alemães, ou apenas sarkofóbicos?
Sarkozy fez questão de ser o primeiro chefe de Estado a cumprimentar Barack Obama por sua vitória. O "Le Monde" assinalava, num texto deliciosamente irônico, que o presidente francês vai ter que fazer muito mais fogos de artifício para aparecer agora que a “Obamania” tomou conta do mundo. Era fácil brilhar tendo ao lado figuras lamentáveis como Bush ou Berlusconi. Fica mais difícil com o carismático Obama no cenário político mundial.
Outro que mais uma vez se excedeu foi o milionário com pinta de camelô bem-sucedido que governa a Itália. Ao dizer que Obama é “jovem, belo e bronzeado” Berlusconi mostrou-se, mais uma vez, à altura de sua biografia de “parvenu”. E dispensa comentários.

FRANÇOIS, JACQUES E NICOLAS

Os últimos presidentes franceses se chamaram François, Jacques e Nicolas.
Quando a França elegerá um Muhamad ou Jamel? Respondo: “Ce n’est pas demain la veille”, como diz o ditado francês. A expressão que acho deliciosa (“amanhã não é a véspera”) quer dizer exatamente isso: nem tão cedo um francês mestiço governará o país.
No momento em que o mundo inteiro festejava a eleição do primeiro presidente americano mestiço, os jornalistas e intelectuais franceses começaram a se interrogar sobre a visibilidade das minorias na França.
O realidade não é muito animadora. Isso sem nem levar em conta a remotíssima hipótese de um presidente negro ou mestiço no país de Voltaire. Apenas uma olhada na mídia e no Parlamento já daria para perceber o atraso da França em matéria de promoção da diversidade étnica.
Tanto na vida política quanto na mídia francesa as minorias de origem árabe, asiática ou africana estão muito pouco representadas. Na Assembléia Legislativa há apenas uma deputada de origem africana. Nenhum deputado de origem árabe ou asiática toma assento entre os 577 deputados franceses.
Na mídia audiovisual, essa representação também é muito menor do que o ideal, segundo o Observatório da diversidade na mídia, criado no ano passado e ligado ao Conselho Superior do Audiovisual (CSA). Como álibi, os canais France 3 e TF1 têm respectivamente Audrey Pulvar e Harry Roselmack, dois belos e competentes apresentadores de origem africana.
No país dos direitos humanos, em que falar de raça ou origem étnica é uma heresia intolerável (não se sabe quantos árabes, negros ou judeus existem na França por causa do tabu de recensear a população por características étnicas ou mesmo origem religiosa), a luta contra discriminações no audiovisual está inscrita na lei sobre igualdade de oportunidades, adotada em 2006 no governo de Jacques Chirac.
No ano passado, a imprensa debateu durante várias semanas a validade de recensear a população através de classificações étnico-raciais, como queria o governo Sarkozy. A iniciativa foi denunciada como uma deriva perigosamente racista pela associação “SOS Racisme”, que publicou uma petição contra o recenseamento étnico, assinada por intelectuais e diversas personalidades.
No dia 15 de novembro do ano passado, o Conselho Constitucional validou a lei do governo Sarkozy que introduzia testes de DNA no direito dos estrangeiros. Por outro lado, o mesmo Conselho anulou o artigo que autorizava as estatísticas étnicas.
Eis alguns trechos da petição de “SOS Racisme”, assinada por milhares de pessoas. Em francês, para manter o sabor do texto original:
(...)
Je refuse que quiconque me réclame ma couleur de peau, mon origine ou ma religion… Ni l’Etat, ni mon chef d’entreprise, ni un institut de sondage. Je refuse que l’on puisse faire de même avec mon conjoint, mes enfants ou mes parents… Mon identité ne se réduit pas à des critères d’un autre temps… Celui de la France coloniale ou d’avant août 44.
Je m’oppose à un Etat qui réhabilite une nomenclature raciale en se fondant sur la couleur de peau ou établisse un référentiel ethnico-religieux sur la base d'origines ou d'appartenances confessionnelles réelles ou supposées en totale contradiction avec les libertés et droits fondamentaux de la personne.
(…)
Autoriser de telles les « statistiques ethniques » conduit à renforcer une vision ethnicisante du monde et offre une prétendue caution scientifique aux stéréotypes racistes qui continuent malheureusement de travailler de l’intérieur la société française. Après les tests ADN qui organisent un « tri » parmi les immigrés, la dimension raciale et/ou ethnique ne doit pas servir à diagnostiquer les Français.
Je refuse que l’on m’enferme dans une catégorie ethno-raciale pour finalement, à l’aide de cette dangereuse grille d’interprétation, définir mes droits et juger mes comportements …
(…)

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