segunda-feira, 1 de março de 2010

Contra o assassinato legal



« A pena de morte é a negação absoluta dos direitos humanos. Trata-se de um assassinato cometido pelo Estado com premeditação e a sangue frio. Esse castigo cruel, inumano e degradante é imposto em nome da Justiça”. (Anistia Internacional).
O 4° Congresso Mundial contra a Pena de Morte se reuniu nos dias 24, 25 e 26 de fevereiro em Genebra e em sua declaração final afirma que a pena de morte “não pode em nenhum caso ser considerada uma resposta apropriada às violências e às tensões por que passam as sociedades contemporâneas, apesar da carga emocional que elas suscitam, inclusive no contexto do terrorismo”.
Durante os debates, que acompanhei pela televisão e pelos jornais, abolicionistas do mundo inteiro discutiram o assassinato de Estado, para tentar continuar avançando em direção à abolição universal. Cento e quarenta países não admitem mais a pena capital. Mas essa tendência é recente. Infelizmente um grande número de países como a China, os Estados Unidos e o Japão ainda executam homens e mulheres, muitas vezes inocentes do crime pelo qual são acusados. Qual o crime de Jesus Cristo, condenado à pena capital? Nos Estados Unidos, desde 1976, mais de 100 pessoas foram libertadas dos corredores da morte, depois de terem sido inocentadas. Outros acusados foram executados apesar de sérias dúvidas sobre sua real culpa.
Um americano que esteve no corredor da morte e foi inocentado esteve em Genebra para dar testemunho do que é viver com uma condenação à morte : é lutar contra a loucura a cada minuto num isolamento total.
A mulher de outro condenado, o americano Hank Skinner, de 45 anos, preso desde os 31 anos, acusado da morte de sua companheira e das duas filhas dela, também participou ativamente dos trabalhos. Skinner clama sua inocência e sua atual mulher, a francesa Sandrine Ageorges, com quem ele se casou na prisão, vive atualmente em função da luta pela libertação de seu marido, que pede sem sucesso a realização de testes de DNA para provar sua inocência. A Justiça americana se recusa a fazê-los e sua execução está marcada para 24 de março deste ano. Na semana passada, o canal franco-alemão ARTE deu uma entrevista exclusiva com Skinner, que falou de sua inocência e da absoluta necessidade dos testes DNA. Revoltante, quando se lê que o processo dele foi cheio de falhas e irregularidades.
Hoje, 103 países aboliram a pena de morte em qualquer circunstância, 38 aboliram em tempos de paz ou aboliram de fato na medida em que não executam há mais de dez anos.
Os campeões da pena de morte em 2008 foram: China (1718 assassinatos de Estado), Irã (346), Arábia Saudita (102), Estados Unidos (37), Paquistão (36), Iraque (34), Vietnã (19), Afeganistão (17), Coréia do Norte (15) e Japão (15).

Gaza – strophe

Gaza-strophe, le jour d’après (trocadilho com catastrophe) é o novo filme dos cineastas Samir Abdallah e Khéridine Mabrouk, recém-lançado em Paris. Uma catástrofe como diz o título. As testemunhas do ataque de Estado de Israel são inúmeras, mostram para a câmera um território devastado, contam suas vidas sem horizonte.
Obviamente, as imagens são de depois da guerra uma vez que Israel proibiu a entrada de qualquer jornalista em Gaza durante os bombardeios, de dezembro de 2008 a janeiro de 2009. O que se vê são casas, hospitais e escolas destruídos, muitos escombros, campos devastados. Resultado das bombas de fragmentação e de fósforo, proibidas pela ONU mas usadas abundantemente por Israel contra um povo acuado entre o mar e uma fronteira fechada a cadeado por Israel.
Como era de se esperar, houve pressões de grupos judaicos para que um canal de TV francês não transmitisse o documentário. A guerra de imagens é tão importante quando a verdadeira guerra, todo mundo sabe. Mas a União judaica francesa pela paz se colocou claramente do lado dos que defendiam a exibição do filme. “Fazer com que se ouça e veja o testemunho único que representa o filme Gaza-strophe é um ato de cidadania e de moral. O silêncio que alguns querem impor sobre Gaza é que seria condenável e fora da lei”, dizia um comunicado da Union Juive Française pour la Paix assinado por Michèle Sibony e André Rozevègue.
A historiadora Esther Benbassa, autora, entre outros livros, da Petite histoire du judaïsme (Paris, Librio, 2007) e Dictionnaire des mondes juifs (Paris, Larousse, 2008, com J.C. Attias) nasceu em Istambul, viveu alguns anos em Israel e hoje vive na França onde é professora e pesquisadora. No ano passado, ela lançou o livro Etre Juif après Gaza (Paris, CNRS Editions, 2009) para falar do mal-estar dos judeus depois da guerra de Israel contra Gaza. Ela resume seu dilema: “Não posso ser judia sem Israel nem com Israel tal como ele é hoje”.
O livro é de uma honestidade admirável. Um trecho que revela a intelectual engajada: “Depois de Gaza, um novo muro se constói na diáspora, o muro da impossível comunicação entre os judeus e os que os cercam, que não podem compreender a excessiva tolerância daqueles quando se trata de Israel. Quem quer viver atrás desse muro? Até quando? Israel tal como se mostra hoje, Israel que Gaza produziu ou revelou, esse Israel não poderá responder às aspirações dos judeus da diáspora, nem continuar a beneficiar da aprovação da opinião pública mundial. Israel pós-Gaza não é mais, com certeza, o que os judeus e os israelenses capazes de ignorar a propaganda oficial, esperam dele... É preciso que um dia ou outro pare o estranho e inconsciente cálculo pelo qual cada israelense morto vem inelutavelmente se somar aos seis milhões de vítimas do genocídio, diante do qual o número de mortos do outro campo, por mais importante que seja, parece sempre irrisório”.

Retour sur la Question Juive

No seu livro “Retour Sur la Question Juive” ("Retorno à Questão Judaica", ed. Albin Michel, 321 págs.), lançado recentemente em Paris, a historiadora da psicanálise Elisabeth Roudinesco volta a um tema polêmico já tratado por Marx e por Sartre. Ela rememora a história do antissemitismo na Europa, que teve seu ponto culminante na tentativa nazista de extermínio dos judeus.

A obra trata também do nascimento do sionismo, da criação de Israel, um Estado sui generis, que ela vê ameaçado pelos conflitos internos. “Defendo soluções para evitar um mundo que seria o pior pesadelo, o de judeus racistas e árabes antissemitas. E nesse pesadelo já estamos”, diz ela na entrevista concedida à Tropico

Nenhum comentário: