Deu
no Libération:
“A
Grécia liquida seus serviços públicos – Atrasado, o programa de
privatização exigido pelos credores do país rende pouco.”
Na
página seguinte outro título :
“A
grande liquidação do patrimônio público espanhol – Tudo deve ser vendido até
2015.”
O
Brasil já fez esse trabalho sujo no governo FHC, que privatizou grande parte
das nossas empresas estatais. Antes, os militares tinham se encarregado
de sucatear nossos serviços públicos de saúde e educação para satisfazer a
ganância de empresários que passaram a ter lucros com serviços que deveriam ser
oferecidos a todos, gratuitamente e com qualidade.
Manifestação em Paris em defesa dos hospitais públicos, em 2007
Agora,
ao ver a Europa começar a sacrificar os direitos dos trabalhadores no altar do
neoliberalismo, constatamos que, mais uma vez, o Brasil está à frente do mundo.
Ao criar o fator previdenciário, que hoje daria uma aposentadoria em torno de
12 mil reais a quem cotizava pelo teto, o governo FHC condenou os empregados
do setor privado a trabalhar até o dia do último suspiro.
Manifestação contra a reforma da aposentadoria, Paris out-2010
Borboletas
em perigo
Deu
no Le Monde :
“Na
Europa, o número de borboletas caiu para a metade em vinte anos. A agricultura
intensiva e a diminuição dos prados provocam o desaparecimento dos
lepidópteros”.
Quando
uma espécie está em risco, é a vida na Terra que corre risco. Mas há quem
ache que ecologia é supérfluo, perda de tempo. Depois de destruir os
ecossistemas, como o homem vai sobreviver num planeta devastado ? A natureza
criará novas harmonias?
O homo
sapiens, o pior predador da natureza, avança no sentido de provocar
seu próprio fim?
A
pedra no sapato de Obama
Deu
na revista online O canibal:
O
jornalista Glenn Greenwald, do Guardian, responsável pelo furo mundial
sobre a espionagem dos Estados Unidos, deu uma excelente entrevista à revista O
canibal (http://www.ocanibal.com.br/). A entrevista é
intitulada “A pedra no sapato de Obama” e foi feita por Clarisse Meireles e
Juliano Borges:
“É
engraçado, lembro do dia em que Obama ganhou o Prêmio Nobel, acordei e vi a
notícia na primeira página do New York Times. Eu realmente achei que era uma
piada, que o site do jornal tinha sido invadido por hackers ou algo assim. Me
perguntava se aquilo era possível. Três semanas antes ele tinha anunciado que
ia intensificar a Guerra no Afeganistão. Eu havia passado o ano escrevendo
sobre como o Governo Obama repetia as mesmas políticas que havia condenado
quando implementadas por George W. Bush e Dick Cheney. Não estava ainda tão
claro a que extremos ele chegaria, Obama na verdade radicalizou muitas das
políticas que antes criticava.”
Desenho de Leonardo Gouvea
Desenho de Leonardo Gouvea
(...)
“Quando
ele foi eleito e disse que ia fechar Guantánamo, era simplesmente porque era um
símbolo, mas o projeto era apenas transferir a prisão para o solo americano, e
continuar a prática de encarcerar pessoas sem nenhuma acusação formal. O que
torna Guantánamo horrível não é o fato de estar em Cuba, como se fosse melhor
estar em solo americano. O que é horrível são as condições desumanas, o fato de
as pessoas estarem presas sem acusações ou julgamento, sem prova alguma contra
elas, algumas há uma década.”
(...)
“E se as pessoas não se dão conta que ele não mudou
nada na política externa em relação a Bush é porque ele é um grande ator. Passa
aquela imagem de bom marido, bom pai. O que faz um bom político é a capacidade
de fazer você ouvir o que você quer ouvir. Ele é excelente nisso. Além disso,
muita gente imagina que pelo fato de ser negro, ser visto como liberal, ele foi
eleito com uma plataforma contra todas essas políticas, é cool e jovem. É como
uma marca.”
“Isso é aliás bem interessante. A indústria da
propaganda premia todo ano os melhores comerciais, posicionamento de produtos
etc. E uma das categorias de mais prestígio é melhor branding (marca), para
premiar um produto que conseguiu ser amado. Em 2008, o prêmio foi para a
campanha Obama. É isso o que ele é: uma marca.”
“E o que o relatório dizia é que a melhor forma de
conter esta “ameaça pacifista” seria a eleição de Obama, porque no lugar de
Bush, um cowboy religioso e arrogante entraria aquele liberal sofisticado,
professor de Direito, que estudou em Harvard, negro, progressista. E a CIA
estava certa. Com a chegada de Obama, muita gente que estava contra os EUA de
repente ficou do seu lado de novo, porque eles passaram a acreditar que o que
estava sendo feito era realmente o melhor.
É um caso de propaganda muito bem sucedido. O
movimento pacifista praticamente desapareceu na última eleição.”
Brasileiros
nas ruas : mudança já
Do
sociólogo espanhol Manuel Castells, professor em Paris e nos Estados Unidos,
sobre os jovens urbanos que saíram às ruas do Brasil e são acusados de não
terem projetos “claros” para mudar a sociedade:
“Além
de passarem por uma série de problemas urbanos, ainda se exige que eles façam o
trabalho de profissional que deveria ser dos burocratas preguiçosos
responsáveis pela bagunça nos serviços. Os cidadãos só apontam os problemas.
Resolvê-los é trabalho para os políticos e técnicos pagos por eles para
fazê-lo.”
Cosi fan tutte por Michael Haneke
Gênio
é gênio. Fomos ver a montagem do diretor Michael Haneke (Amour, Le ruban blanc) da ópera de Mozart em Bruxelas. Puro
deleite. Uma mise-en-scène genial, misturando personagens em costumes de diferentes
épocas, um cenário despojado e elegante, figurinos perfeitos. Vozes e
interpretações idem. O público delirou no elegante Théâtre de la Monnaie.
Ao
chegarmos ao hotel The Dominicans (FOTO), a música do elevador nos transportou a
um monastério. Em total harmonia com o nome, a música ambiente reproduz cantos
gregorianos. Elegante, charmoso, o hotel, no centro de Bruxelas, bem perto da
Catedral e da Ópera é um excelente endereço. E ainda por cima, come-se bem no
elegante restaurante do Dominicans. Aliás, depois que Frei Tito entrou na minha
vida, dou de cara com dominicanos em toda parte.
Na
véspera da ópera, Bruxelas viu desfilarem milhares de pessoas contra a Montsanto,
que ameaça nos envenar com o milho transgênico (o MON810). Essa cultura
transgênica, proibida até hoje na França, foi liberada esta semana pelo
Conselho de Estado. Mas o ministro da Agricultura diz que não quer ver o milho
da Montsanto na mesa dos franceses.
Os
ecologistas belgas levaram milhares de pessoas às ruas de Bruxelas para dizer
não à Montsanto.
Várias gerações se misturavam, com cartazes em
francês, em flamengo e em inglês.
Um
belo espetáculo de consciência cidadã.
HENRI ALLEG (1921-2013)
A morte de um herói discreto
Por Leneide
Duarte-Plon em 30/07/2013 na edição 757 Observatório da Imprensa
Em fevereiro
de 1958, graças ao livro La Question, de Henri Alleg, a França
descobriu que seu Exército torturava na Argélia, como os nazistas da Gestapo
tinham torturado os resistentes franceses. Imediatamente, o jornalista
comunista nascido em Londres sob o nome de Harry Salem, filho de judeus
russo-poloneses, se transformou num ícone da luta anticolonial, em plena guerra
da Argélia.
Antes,
alguns intelectuais haviam escrito artigos na imprensa mas naquele livro, um
homem torturado dava seu testemunho. O diretor do jornal Alger
Républicain – militante da luta anticolonialista, sequestrado e preso no
ano anterior – confirmava as suspeitas num relato que se transformou
imediatamente num best-seller. A partir da segunda edição, o livro passou a ter
um posfácio de Jean-Paul Sartre, no qual o filósofo dizia: “Henri Alleg pagou o
mais elevado preço para ter o direito de continuar um homem”.
Dia 17 deste
calorento mês de julho, Henri Alleg faleceu em Paris, aos 91 anos, vítima de um
AVC. Os principais jornais franceses noticiaram sua morte com espaço dedicado
somente aos grandes personagens. O Le Monde deu uma página
inteira, Libération, duas, e o comunista L’Humanité, do qual
Alleg foi diretor, deu a notícia na capa, ressaltando os combates do jornalista
e escritor contra o colonialismo, a opressão e todo tipo de racismo.
O presidente
François Hollande louvou “o anticolonialista ardente cujo livro alertou o país
sobre a realidade da tortura na Argélia”.
O secretário
nacional do Partido Comunista Francês, Pierre Laurent, escreveu que o nome de
Henri Alleg “permanecerá para sempre sinônimo de verdade, de coragem, de
justiça”.
O diretor do
jornal L’Humanité, Patric Le Hyaric, escreveu :
“A melhor homenagem que o Estado francês poderia fazer
a Henri Alleg seria, enfim, reconhecer oficialmente a tortura na Argélia, assim
como os crimes de guerra.”
Outra
articulista, Rosa Moussaoui ressaltou que Alleg combateu “até o fim, sem
cessar, a direita francesa sempre disposta a exaltar os ‘aspectos positivos’ da
colonização”. Ela se referia ao longo debate durante o governo de Nicolas
Sarkozy que, tentando reabilitar o período colonial, se pôs a apontar “aspectos
positivos” na colonização francesa.
O livro
Quando foi
proibido na França, três meses depois de ser lançado, o livro La Question
já era um best-seller, com 65 mil exemplares vendidos. O governo do
general Charles De Gaulle, tendo o escritor André Malraux como ministro da
Cultura, não sabia ainda como iria acabar a guerra que, aliás, não era chamada
de guerra pela França, mas “les événements d’Algérie” (os acontecimentos da
Argélia). A expressão guerra da Argélia só foi imposta pelos historiadores muito
depois da independência da antiga colônia.
A partir da
proibição, o livro passou a ser impresso na Suíça e depois saiu em diversos
países. Na França, o texto de Alleg passou a ser distribuído clandestinamente
por uma rede de militantes católicos, socialistas e comunistas. Antes do livro,
a revista católica Esprit havia denunciado a tortura na
Argélia, mas Alleg veio trazer à opinião pública um texto-testemunho de grande
qualidade literária. Nele não há psicologia ou
julgamento moral – o texto é límpido, seco e objetivo.
O relato de Alleg tinha deixado a prisão em folhas soltas, levadas por seu
advogado, burlando o controle dos torturadores. La question foi editado por Jérôme Lindon nas
Editions de Minuit, num clima de debate passional entre os anti e os pró-colonização.
O livro despertou a consciência de toda uma geração que descobriu horrorizada a
tortura exercida pelos paraquedistas franceses em nome do combate à “subversão”
da Frente de Libertação Nacional, que lutava pela independência da Argélia.
Em 1960,
Alleg foi condenado a 10 anos de trabalhos forçados. No ano
seguinte, fugiu da prisão indo se refugiar num país do Leste europeu. Escreveu diversos livros e dedicou
toda sua vida ao jornalismo, à causa comunista e ao combate anticolonialista.
A notícia da
morte de um herói discreto me transportou ao mês de dezembro de 2011, quando
fui à sua casa na banlieue parisiense para uma entrevista em torno do
seu livro e de sua experiência de resistente à guerra colonial na Argélia. Ele
será um personagem do livro que estou escrevendo sobre como os militares
franceses na Argélia exportaram técnicas de tortura e de controle das
populações civis através do general Paul Aussaresses, que viveu no Brasil por
quase três anos como adido militar da França.
Apesar da
idade avançada, Alleg tinha a memória intacta e a inteligência preservada pelo
tempo. E ao contar sua prisão, tortura e engajamento, seus olhos brilhavam
cheios de vida e de generosidade.
***
Leneide
Duarte-Plon é jornalista, em Paris
Fotos de Leneide Duarte-Plon
Fotos de Leneide Duarte-Plon
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