« O Brasil ou faz sua revolução
socialista — a revolução dos pobres, dos deserdados, desgraçados, degredados e
degradados — ou então jamais se integrará como nação dona de si e de sua
totalidade nacional capaz de ser sujeito e não objeto da história […] essa
gente (a burguesia brasileira), ao menor sinal de abatimento, ou mal‑estar, entregou, entrega e entregará o país aos
militares, e estes são o braço armado dos ricos contra os pobres […] A saída —
beco sem saída — é a força das armas, é a repressão, é a violência a serviço da
morte contra a vida. VIVA LA MUERTE! É esta a bandeira das Forças Armadas no Brasil. »(Helio Pellegrino carta a Otto Lara
Resende de 25-07-68)
Copa do Mundo 2014. JO 2016.
Direitos Humanos 20… ?
Com esse título, o boletim da
ACAT (Action des Chrétiens pour l’Abolition de la Torture) denuncia graves
violações dos direitos humanos no Brasil
de « populações carentes ».
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O texto explica como funciona a
polícia no Brasil, uma polícia civil e uma militar, realizando prisões
arbitrárias e utilizando a tortura « em total impunidade », sob o
pretexto de realizar uma « guerra contra o crime organizado ».
Segundo o texto, a polícia brasileira
é responsável por 2 mil mortes por ano. Não raro, os policiais participam de
redes de corrupção, extorsão, tráfico de armas e de drogas. As principais
vítimas são jovens rapazes habitantes dos bairros pobres. “Os juízes que tentam
condenar essas práticas se tornam alvo de intimidações e de ameaças.”
A violência policial se agravou
nos últimos anos com a perspectiva da Copa do Mundo de futebal de 2014 e dos
Jogos olímpicos de 2016. Segundo o boletim da ACAT, com o objetivo de
tranquilizar os organizadores, as autoridades cobrem ou reforçam as
intervenções brutais das forças policiais.
«Os policiais multiplicam as
invasões de domicílio, torturas, desaparecimentos (35 mil no Rio de Janeiro
desde 2007, segundo a ONG Rio de Paz) e execuções.»
Para quem quiser passar à Ação
contra a tortura, o boletim propõe uma
carta a ser enviada ao ministro da Justiça José Eduardo Cardozo pedindo, entre
outras coisas que “as missões de manutenção da ordem pública sejam feitas exclusivamente
pelas forças de polícia civil.”
Um homem torturado: nos passos de frei Tito de Alencar
Leneide
Duarte-Plon e Clarisse Meireles
Editora
Civilização Brasileira
420 páginas
“Ato de memória insurgente, a leitura deste livro, sem
dúvida, alimenta e atualiza em cada um de nós a capacidade de indignação.” – Frère Xavier Plassat
Para Tito de Alencar Lima, 4 de
novembro de 1969 foi o primeiro dia de uma prisão que duraria um ano e dois
meses. Torturado no Deops e depois na Operação Bandeirantes, sob a acusação de
pertencer à Ação Libertadora Nacional (ALN) – organização de luta armada
fundada por Carlos Marighella –, Tito foi destruído psiquicamente por seus
carrascos.
Escolhido a contragosto para ser
um dos presos trocados pelo embaixador suíço, em 11 de janeiro de 1971, banido do
território nacional por decreto, o frade dominicano viajou para Santiago do
Chile juntamente com sessenta e nove presos políticos.
Na capital chilena, Tito deu entrevista aos cineastas
americanos Haskell Wexler e Saul Landau, autores do documentário “Brazil, a
report on torture” (Brasil, um relato de tortura), com testemunhos de ex-presos
políticos torturados nas prisões brasileiras. Na Alemanha, foi entrevistadona
TV e responsabilizou parte do clero conservador por conivência com a ditadura,
que negava a existência de torturas.
Passou por Roma, onde não pôde falar a religiosos no
Colégio Pio Brasileiro porque a hierarquia, conhecendo sua fama de
“terrorista”, não quis recebê-lo. Foi para Paris, onde, por dois anos, morou no
Convento Saint-Jacques. Na capital francesa militou ao lado de brasileiros na
denúncia das torturas praticadas pela ditadura.
No Convento Sainte-Marie de LaTourette,
perto de Lyon, para onde se mudou em 1973, esperava encontrar um porto seguro e retomar os estudos de
teologia. Em meio à natureza, no alto de uma colina, Tito encontrou o silêncio,
mas não a tranquilidade. Levara dentro de si seus torturadores. Em 10 de
setembro de 1974, o corpo do frade foi visto por um camponês, pendendo de uma
árvore, perto de uma área inóspita, às margens do rio Saône. Tito foi enterrado
no cemitério do convento. Seu corpo voltou ao Brasil em 1983. Hoje, repousa em
Fortaleza.
O filósofo Jean Améry, amigo de Primo
Levi, escreveu que quem foi submetido à tortura fica “incapaz de sentir-se em
casa neste mundo”. O ultraje do aniquilamento é indelével, “a confiança no
mundo que a tortura apaga é irrecuperável”.
De
4 de novembro de 1969, dia em que foi preso, a 10 de agosto de 1974, quando foi
encontrado morto, Tito viveu como alguém que não se sentia mais em casa neste
mundo. Tito de Alencar Lima preferiu a morte a conviver com a tortura, que não
se apagava de sua memória.
Duas psicanalistas dicionarizadas
A convite de Chantal Major
escrevi para o Dictionnaire des femmes
Créatrices, publicado pela Editions des Femmes, um resumo biográfico de
Helena Besserman Vianna e de Nise da Silveira, duas brasileiras que honraram a
profissão de psicanalista. Abaixo os verbetes :
BESSERMAN VIANNA,
Helena (Rio de Janeiro 1932 – 2002)
Médecin
et psychanalyste
Helena
Besserman Vianna fut qualifiée de
« pasionaria » pour son courage et sa ténacité dans la
dénonciation, en 1973, d’un analyste en formation dans une société de
psychanalyse de Rio de Janeiro comme participant activement à des séances de
torture pendant la dictature militaire. Dans sa lutte contre le silence et
l’oubli elle aura ainsi mis à mal la prétendue « neutralité
psychanalytique ».
C’est
le journal communiste clandestin Voz Operária
qui publia la nouvelle en donnant le nom du médecin, Amilcar Lobo, ainsi que
celui de son analyste, Leão Cabernite, qui présidait à l’époque la Société
Psychanalytique de Rio de Janeiro (SPRJ), associée à l’IPA (Association Psychanalytique
Internationale). Cette information fut transmise avec une note manuscrite à la
revue argentine Cuestionamos que
dirigeait alors la psychanalyste Marie Langer qui s’était réfugiée en Argentine
après avoir fuit le régime nazi. La nouvelle circula à travers le monde
psychanalytique et arriva à la connaissance du Président de la Confédération
Psychanalytique d’Amérique Latine (COPAL),
et du Président de l’Association Psychanalytique Internationale (IPA),
Serge Lebovici.
Pour
identifier l’auteur de la dénonciation anonyme, la SPRJ fit appel à un
spécialiste pour procéder à des investigations graphologiques qui permirent de
reconnaître l’écriture d’Helena Besserman Vianna. Au lieu de vouloir établir la
véracité de la dénonciation, la SPRJ préféra qualifier l’information de
« calomnie ».
Helena
Besserman Vianna, qui appartenait à la Société Brésilienne de Psychanalyse de
Rio de Janeiro (SBPRJ-IPA), sera désignée
comme calomniatrice par les Conseils des deux Sociétés de Rio, soumise aux
pires intimidations. Elle échappera, parfois de justesse, à l’exécution de
nombreuses menaces ainsi qu’à un attentat. Par ailleurs, la SBPRJ empêcha la
psychanalyste d’accéder au statut de membre titulaire.
En 1994, elle publie à Rio Não conte a ninguém – Contribuição à
história das Sociedades Psicanalíticas do Rio de Janeiro (Imago), livre
dans lequel elle raconte, documents à l’appui, son combat de 20 ans. Politique de la Psychanalyse face à la
Dictature et à la torture – N’en parlez à personne (L’Harmattan,
1997) est publié à Paris avec une préface et une lettre ouverte de René
Major qui était alors Président de la Société Internationale d’Histoire de la
Psychiatrie et de la Psychanalyse. Dans sa lettre, René Major présente sa
démission comme membre de l’Association psychanalytique internationale.
Cette
histoire inspira à René Major la convocation des Etats Généraux de la
Psychanalyse, qui eurent lieu à Paris en juillet 2000 et furent marqués par un
discours mémorable de Jacques Derrida. C’est dans ce cadre qu’Helena Besserman
Vianna annonça sa démission de l’IPA.
Fille
de juifs polonais et membre du Parti Communiste Brésilien jusqu’en 1968, Helena
Besserman Vianna exerça la psychanalyse à Rio où elle fut formée par Zenaira
Aranha. Elle reprit ensuite une analyse
à Paris avec André Green.
Avec
Teresa Pinheiro, elle a écrit « As bases do amor materno » (Escuta,
1991) autour de la conférence de Margarete Hilferding sur l’amour maternel.
DA SILVEIRA, Nise, psychiatre
(Maceió 1906 – Rio de Janeiro – 1999)
Quand
la psychiatre Nise da Silveira commence ses études de médecine à Salvador de
Bahia, elle a 16 ans et elle est la seule femme de la promotion (158 élèves) de 1926, où elle rencontre Mário
Magalhães da Silveira qui deviendra son mari. En 1933, elle passe un concours
public et devient médecin de l’hôpital de Praia Vermelha, à Rio de Janeiro. En
1936, arrêtée comme communiste pendant la dictature de Getúlio Vargas, elle
devient un des personnages du roman Memórias
do cárcere (Mémoires de la prison) du grand écrivain Graciliano Ramos, arrêté dans la même prison.
Après 18 mois de détention, elle fut libérée mais écartée du service public
pour des raisons politiques. Le plus important héritage de Nise da Silveira -
qui étudia à Zurich à l’Institut Carl Gustav Jung de 1957 à 1958 et entre 1961
et 1962 - demeure le Musée des Images de l’Inconscient (Museu de Imagens do
Inconsciente) qu’elle créa en 1952 dans le Centro Psiquiátrico Pedro II. Dans
cet établissement, elle avait fondé en 1946 un service de thérapie
occupationnelle qu’elle dirigea jusqu’en 1974 et dans lequel les malades
mentaux s’exprimaient par le moyen de dessins, de peintures et de sculptures.
Farouchement opposée à l’utilisation par la psychiatrique traditionnelle des
chocs électriques, elle mena un combat sans merci contre la pratique de la
lobotomie encore à l’usage à l’époque. En 1956, elle fonda la Casa das
Palmeiras, à Rio de Janeiro, qui fonctionne comme hôpital de jour pour les
patients ayant quitté l’hôpital psychiatrique. Son travail a inspiré la
création de plusieurs musées e institutions thérapeutiques comme l’Association
Nise da Silveira-Images de l’Inconscient à Paris, le Centro de Estudos Imagens do
Inconsciente, de l’Université de Porto, au Portugal ou encore le Museo Attivo
delle Forme Inconsapevoli à Gênes, en Italie. Le musée Imagens do Inconsciente
de Rio de Janeiro possède un fonds de plus de 300 mille travaux de malades mentaux parmi lesquels Fernando
Diniz et Bispo do Rosário, qui sont devenus très célèbres. Nise da Silveira créa en 1957 un groupe d’études de
psychanalystes, psychiatres et psychologues qui se réunirent jusqu’à sa mort en
1999. Elle a notamment écrit Jung: vida e
obra (1968), Imagens do Inconsciente
(1981) - Images de l’inconscient
(Halle Saint-Pierre Passage Piétons Editions, Paris, 2005) et Cartas a Spinoza (1990). Plusieurs films
et expositions ont été réalisés au Brésil sur l’œuvre de Nise da Silveira qui a
reçu en 1993 la médaille Chico Mendes pour son combat pour les droits de
l’homme.