sábado, 1 de março de 2008

O sintoma Sarkozy

Por Leneide Duarte-Plon

Em seu novo livro, o filósofo Alain Badiou diz que o presidente francês é sintoma do medo e das divisões da sociedade francesa

O filósofo Alain Badiou, de 70 anos, ex-aluno do marxista Louis Althusser e um dos principais pensadores da atualidade, transformou seu seminário do ano passado na École Normale Supérieure, em Paris, em espaço de discussão sobre a eleição de Nicolas Sarkozy e o que ela representa no cenário político de uma França na qual a esquerda vive uma crise sem precedentes.
O livro “De Quoi Sarkozy Est-il le Nom?” (Sarkozy É o Nome de Quê?) é o resumo daqueles seminários numa das escolas que formam a elite intelectual francesa. Badiou apresenta o novo presidente francês como um sintoma da sociedade que ultrapassa o próprio personagem. Ele vê seu país caminhar para “cair no modelo ianque, a dominação dos ricos, o duro trabalho dos pobres, o controle de todos, a suspeita sistemática para com os estrangeiros, o desprezo dos povos que não vivem como nós”.
Badiou captou o mal-estar sentido por parte dos franceses que vivem, segundo ele, uma ressurgimento do “pétainismo”, cuja principal característica é um desejo de segurança. Enfim, Sarkozy seria produto do medo. Produto de uma história francesa dividida entre dois pólos: revolução e contra-revolução, resistência e colaboração, desejo de liberdade e igualdade e desejo de autoritarismo e ordem.
“Acho que Sarkozy tem uma visão deformada da humanidade. Ele pensa que todo mundo pode ser corrompido, me parece profundamente convencido disso. Na sua opinião, todo mundo tem um preço. Ele tem medo de encontrar pessoas que não têm preço”, diz Badiou.
Em poucos meses, a obra vendeu 20 mil exemplares, um sucesso extraordinário no mundo das idéias e sobretudo no campo filosófico. Os livros de Badiou não costumam vender mais de 3 mil exemplares.
Na entrevista a seguir, Badiou afirma que Sarkozy representa o fim de um longo período histórico na França e defende que o Partido Comunista Francês seja dissolvido e as idéias marxistas sejam retomadas em um outro dispositivo político _nem a internacional de Marx, nem o partido de Lênin. "Hegel dizia: 'Tudo o que nasce merece morrer'. Pois bem, o Partido Comunista Francês nasceu em 1920 e pode morrer em 2010", diz o filósofo.
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O que levou o sr. a escrever este livro?
Alain Badiou: Durante meu grande seminário público do ano passado, senti quase fisicamente que as pessoas estavam preocupadas com a eleição presidencial e que, mesmo que não fosse meu tema, era preciso falar disso. É o que afirmo no início do livro. Eu disse: vejo que é preciso que lhes fale disso, e então fiz uma aula antes da eleição e duas outras após a eleição. Foi no contato direto com o público que freqüenta meu seminário na École Normale Supérieure que senti que deveria, na qualidade de filósofo, falar sobre o problema. Antes da eleição, porque eles estavam preocupados, e depois, porque estavam deprimidos.

O sr. pode explicar o título do livro?
Badiou: Acho que o significado da eleição de Nicolas Sakozy ultrapassa sua pessoa. Eu não queria somente falar do personagem, queria falar do que se passa hoje e de fatos que são resumidos nesse personagem. Isso é mais importante que o personagem, e por isso intitulei meu livro “De Quoi Sarkozy Est-il le Nom?”. Essa é a pergunta importante. Quis explicar às pessoas que não era minha opinião sobre Sarkozy, mesmo que eu tenha uma opinião sobre ele e a expresse, mas a questão era explicar o que estava acontecendo com essa eleição de Sarkozy. É uma situação política na qual Sarkozy é mais um nome que uma força verdadeira.

Na Itália, os políticos e a política perdem credibilidade junto aos eleitores.Sarkozy, que foi comparado a Berlusconi, vai na direção do descrédito da política?
Badiou: Há duas razões que me fazem pensar que Sarkozy vai contribuir para tornar as pessoas mais céticas em relação à política. A primeira é que ele é extraordinariamente cínico do ponto de vista da relação da política com o dinheiro. Ele freqüenta abertamente os milionários, fez um presente aos ricos com diminuição de impostos. Quando, logo depois de sua eleição, foi jantar no Fouquet’s, grande restaurante de ricos, e quando partiu num cruzeiro no iate de um milionário, ele fazia isso de maneira deliberada. Quer que todo mundo possa dizer: “Sou rico, tenho o direito de ser rico”. Ele quer que os políticos possam freqüentar os ricos de maneira aberta. Isso é uma mudança na França, é uma novidade. Mitterrand, por exemplo, disse a seu ministro Tapie, que era um homem de negócios: “Cuidado, os franceses não amam o dinheiro”. Um dos objetivos de Sarkozy é fazer com que os franceses amem o dinheiro, e isso é uma corrupção intelectual, essa ligação cínica entre a política e o dinheiro. Um dia ou outro haverá escândalos. Sem dúvida, haverá escândalos. E a segunda razão é que ele agrava o caráter espetacular da política. Ele passa o seu tempo a utilizar a mídia, com golpes espetaculares, ele está em toda parte, não por razões políticas profundas, mas porque quer se mostrar. Resumindo, sua relação com o dinheiro, com a mídia e com o espetáculo, acho que tudo isso não vai numa boa direção e não contribui para devolver a confiança nos políticos e na política.

Alguns políticos socialistas aderiram ao governo de Sarkozy. Ser socialista na França é realmente ser de esquerda?
Badiou: Acho que os socialistas na França se adaptaram à política governamental e ao sistema econômico e político dominante. Pouco a pouco. A diferença é mais ou menos a que há entre os republicanos e os democratas nos Estados Unidos. São partidos que na realidade estão de acordo sobre a parte mais importante da política, da gestão do Estado e da gestão da economia e que têm uma pequena diferença no tratamento da questão social. Mas, desse ponto de vista, acho que a palavra socialismo não quer mais dizer grande coisa. Durante muito tempo e mesmo no início do governo Mitterrand a palavra "socialismo" significava que se ia nacionalizar a economia, os grandes bancos etc. Eles desistiram completamente disso. Penso que a diferença entre a esquerda e a direita, entre os socialistas e o partido dominante é muito pequena, o que explica aliás que importantes socialistas possam fazer parte do governo Sarkozy. E haverá outros. Fala-se muito da possibilidade de Jack Lang tornar-se ministro da Justiça. Eu diria que a identidade política é mais importante que a diferença hoje.

A França era vista como o último bastião da luta contra a dominação americana. O sr. diz que sob Sarkozy ela vai “cair no modelo ianque, a dominação dos ricos, o duro trabalho dos pobres, o controle de todos, a suspeita sistemática para com os estrangeiros, o desprezo dos povos que não vivem como nós”. É esse o futuro da França?
Badiou : Sem dúvida. Infelizmente, penso que isso é certo. Veja o discurso de Sarkozy sobre o homem africano, sua verdadeira alegria em ser recebido por Bush e por sua família, a decisão de participar mais ativamente da guerra no Afeganistão. Começa-se a falar da entrada da França na Otan e, em política interna, ele dá aos ricos menos impostos e, aos pobres, mais trabalho. Creio que nos dirigimos para um modelo americano de sociedade. Aliás, isso é o que se chama na França há muitos anos de modernização. Quando você é pobre e do povo e lhe falam de modernização, desconfie. Isso quer dizer que eles vão fazer uma revisão das leis trabalhistas. Será uma data muito importante na história do regime, e mesmo na história da França, já que eles vão transformar as leis trabalhistas para agradar evidentemente ao patronato. Do ponto de vista do modelo de sociedade, é para isso que a gente caminha, e, do ponto de vista da política externa, caminhamos na direção de uma normalização da política francesa. O gaullismo representava uma pequena exceção francesa, um pouco de distância em relação aos americanos.

Sarkozy fará um alinhamento automático com os Estados Unidos?
Badiou : Acho que as coisas se farão progressivamente e lentamente. Vai depender das posições das outras potências européias. A França é muito próxima das posições alemãs. Mas essa é uma tendência. A tendência é de se alinhar com o que chamamos de Ocidente.

O sr. se chocou com os panfletos que a polícia colocou nas caixas de correio para pedir à população que denuncie as pessoas que participaram de confrontos em Villiers-le-Bel, em novembro de 2007?
Badiou : Isso me chocou muito. Você sabe que no meu livro falei da época do pétainismo (do general Pétain, que governou a França na época da ocupação nazista) e da Colaboração (com o nazismo). Acho que incitar as pessoas à delação e à denúncia é uma coisa horrível. Que a polícia faça seu trabalho. Não é preciso transformar todo mundo em espião de seu vizinho. Acho que isso ajuda a criar uma atmosfera detestável e não é uma boa forma de resolver os problemas dos bairros populares. Isso vai indispor as pessoas umas contra as outras, vai colocar os adultos contra os jovens, vai dividir os estrangeiros e os franceses. Essa prática é detestável. Fiquei chocado, mas não surpreso, infelizmente.

O sr. diz no livro: "O que Sarkozy mais teme é que seu medo se torne visível". Qual é o medo de Sarkozy ?
Badiou : O medo principal de Sarkozy é o de encontrar uma resistência verdadeira no campo político ou popular. Ele é um homem que tem necessidade de seduzir todo mundo. Ele funciona com cooptação. Logo se viu isso. Ele é um homem que pensa que não existe mais verdadeira oposição. Por isso, acho que é um homem que ficaria muito à vontade com um partido único. Penso que ele teme as oposições verdadeiras, os conflitos verdadeiros e que só está à vontade quando existe um consenso, quando há acordo. Ele governa de maneira clara pela cooptação e pela corrupção. Acho que ele tem uma visão deformada da humanidade. Ele pensa que todo mundo pode ser corrompido. Ele me parece profundamente convencido disso. Todo mundo tem um preço a seu ver. Ele tem medo de encontrar pessoas que não têm preço.

O sr. pensa que ele ousaria suspender o direito de greve?
Badiou : Ele tenta por todas as formas limitar esse direito. Já existe o serviço mínimo, que é uma restrição ao direito de greve. Mas tudo vai depender da relação de forças, do que vai acontecer nos movimentos sociais nos próximos meses e anos. Isso vai ser determinante. Se o compararmos a Thatcher na Inglaterra que também era pela modernização e que devastou literalmente a Inglaterra, vê-se que um episódio fundamental foi o momento em que Thatcher conseguiu quebrar a greve dos mineiros. Isso foi um episódio central para seu governo. Haverá algo análogo para Sarkozy? Será que, em determinado momento, vai haver uma prova de força da qual surgirá claramente um vencedor e um vencido? Não se sabe ainda. As coisas ainda estão indefinidas. No meu livro, digo que Sarkozy representa o fim de um longo período histórico na França em que imperava a balança direita-esquerda. Ele inaugura algo novo e como sempre não se sabe onde isso vai chegar.

Ele sabe o que quer e onde vai ?
Badiou: Acho que não. Por isso ele é mais o nome do período que seu ator. Penso que ele mesmo não sabe muito bem onde vai. Ele tem o gozo do poder de uma maneira muito visível. Mas, fora esse gozo do poder e de algumas direções da qual eu falei antes, americanização no sentido amplo, por onde isso vai passar, quais vão ser os detalhes da vida política na França, não se sabe ainda.

Sartre dizia que "a esquerda é um grande cadáver que cheira mal". O que está acontecendo com a esquerda francesa que não consegue encontrar um líder ou líderes para reestruturá-la?
Badiou: Acho que Sarkozy encontrou uma forma de transformar a direita. Ele encontrou um meio essencial que foi a reunificação da direita e da extrema-direita. É preciso ver que Sarkozy ganhou porque tirou votos do Front National (de Jean-Marie Le Pen). Atualmente não existe um processo simétrico à esquerda. A grande questão da esquerda oficial é saber se ela é capaz de unificar a esquerda e a extrema-esquerda.
É preciso saber que o reino de Mitterrand foi fundado inteiramente sobre o fato de que o Partido Socialista e o Partido Comunista pela primeira vez em suas histórias se aliaram, e que o Partido Socialista “comeu” o Partido Comunista. Mitterrand comeu o Partido Comunista como Sarkozy comeu o Front National. Isto é absolutamente simétrico. Acho que a crise da esquerda vai durar muito tempo, pois não há nenhuma aliança em curso. Sobretudo porque ela está dividida em duas tendências que não vão se reconciliar tão cedo. A tendência que pensa que é preciso ir mais à direita (Strauss-Kahn e Ségolène Royal) e, por outro lado, uma extrema-esquerda que pensa que é preciso ir mais à esquerda. Acho que ainda teremos muitos anos de crise da esquerda.

Como o sr. analisa a liderança do líder de extrema-esquerda Olivier Besancenot?
Badiou : Besancenot não tem uma verdadeira originalidade. Ele está tentando reconstruir um pequeno partido comunista porque o grande morreu. Existe um lugar para isso porque as pessoas são órfãs do Partido Comunista. Se a gente ler os textos, as propostas e a visão política de Besancenot, ela é clássica, tradicional. Acho que não tem grande futuro.

Sarkozy diz que quer acabar de uma vez por todas com a herança de Maio de 68. O sr. pode explicar as causas dessa cruzada?
Badiou : Maio de 68 representou na França o último momento forte da esperança de uma mudança política profunda. Era a idéia que havia uma outra possibilidade além do capitalismo desenfreado, da reação, na época do gaullismo. Foi, pois, um momento de esperança política extremamente forte. Penso que, quando Sarkozy diz que é preciso acabar de uma vez por todas com Maio de 68, ele quer dizer “é preciso acabar com essa esperança”. É mais profundo do que acabar com qualquer coisa que existe realmente. É acabar com a esperança de uma outra política e se instalar de maneira realista e resignada no mundo tal e qual ele é, isto é, no mundo da monstruosidade capitalista atual. Ele diz que não há outra coisa, não há outra esperança. Mas ele não vai conseguir apagar essa esperança.

O sr. escreve: "A hipótese comunista como tal é genérica, ela é o 'fundo' de toda orientação emancipadora e dá nome à única coisa que faz com que valha a pena nos interessarmos pela política e pela história". Por que o Partido Comunista Francês não sabe mais falar ao povo?
Badiou: Acho que, no século XX, com a União Soviética, com os partidos comunistas tradicionais, pouco a pouco a palavra "comunismo" perdeu seu significado genérico. No fundo, comunismo não queria dizer mais uma esperança verdadeira e viva de uma outra sociedade, queria dizer o partido, os Estados socialistas que todos sabíamos que não eram um paraíso, ao contrário. Então, pouco a pouco, em sua realização concreta a idéia comunista perdeu seu vigor, sua força e sua inspiração.
No fundo, o fim do comunismo de Estado, o fim da União Soviética e finalmente o fim dos partidos comunistas ocidentais significa o fim desse período do comunismo. O que digo no meu livro é que nesse momento a gente pode escolher entre duas possibilidades: ou abandona completamente a hipótese comunista, ou renuncia à palavra "comunismo" e procura outra coisa...

O Partido Comunista Francês é o único partido comunista ocidental que não mudou de nome, não?
Badiou: Sim, mas ele pretende mudar. E Olivier Besancenot pensa em tirar a palavra "comunista" do nome de seu partido, a Liga Comunista Revolucionária. A primeira hipótese seria renunciar a essa palavra. Penso que isso seria uma derrota. Acho que se deve valorizar a palavra, dar-lhe vigor, sabor e novidade. É preciso fazer a crítica completa do que foi o comunismo do século XX, reconhecendo que ele teve sua grandeza, encarnou formas de organização popular verdadeiras.
Não se deve jogar o bebê com a água do banho. Precisamos defender e transformar a palavra, criticando o período anterior e não abandoná-la pura e simplesmente, porque penso que, se não temos uma palavra que designe a esperança geral de uma outra política, ficamos enfraquecidos, e é como dizer: “Só podemos mudar poucas coisas”. Mas, se queremos uma esperança geral, acho que a hipótese comunista continua a ser o bom caminho, no sentido que lhe dava Marx, no sentido que ela tinha no século XIX.

E qual é o bom caminho para o Partido Comunista Francês?
Badiou : Morrer de uma vez. Ele deveria propor sua dissolução e sua reconstituição sobre outras bases, outras perspectivas. Como um partido que carrega uma esperança política é uma aventura terminada. Hegel dizia: “Tudo o que nasce merece morrer”. Pois bem, o Partido Comunista nasceu em 1920 e pode morrer em 2010.

Mas, se o sr. considera a hipótese comunista, seria preciso ter um Partido Comunista, não?
Badiou: Isso é um grande problema. Quais as formas de organização adaptadas à hipótese comunista? Acho que isso muda. A idéia de Marx não era a de um partido, era de uma internacional, e a internacional era outra coisa, era uma confederação de organizações. A idéia de Lênin é a de um partido. Depois da idéia de uma internacional no sentido de Marx, depois do partido no sentido de Lênin, penso que devemos entrar numa terceira forma de organização que ainda não conheço. Se soubesse lhe diria...

Seria um furo...
Badiou: Claro, seria um furo. Mas penso que não seria nem a internacional no sentido de Marx nem o partido de Lênin. É preciso criar algo. A grande questão atual é que é preciso reinstalar a hipótese comunista primeiramente. É um trabalho de pensamento, um trabalho teórico, um trabalho intelectual, um trabalho de experimentação social. Mas o problema da organização não está resolvido. Isto é evidente.

Mas o sr. pensa que Marx é sempre atual ?
Badiou: Marx é atual do ponto de vista da formulação da hipótese comunista e de algumas de suas características. Não digo que devemos refazer uma internacional como a internacional de Marx, mas creio que os grandes problemas de hoje sejam internacionais. Por exemplo, dizem que na França não existe mais uma classe operária. Sim, mas em escala mundial há uma enorme classe operária.
Na China, há dezenas, centenas de milhões de operários que trabalham 15 horas por dia em fábricas. Não é, pois, verdade que não exista mais classe operária. Os fenômenos são mundiais. E, portanto, uma das questões difíceis da organização contemporânea da hipótese comunista é sua forma mundial.

Quem faz resistência a Sarkozy atualmente e como se organiza hoje essa resistência?
Badiou: Na análise que proponho da França contemporânea, digo que se vêem quatro forças contra Sarkozy. A juventude dos liceus e das universidades; a juventude popular da periferia ("banlieue"); a grande massa de assalariados comuns, inclusive os ferroviários, os funcionários da RATP (companhia estatal de trens), os técnicos das fábricas, mas também os empregados dos Correios; e, depois, os proletários recém-chegados, a grande massa de operários de origem estrangeira: africanos, magrebinos, asiáticos... São as quatro forças possíveis. Todas essas forças fazem seus movimentos. Houve movimentos estudantis importantes, houve movimentos da juventude popular, houve greves de assalariados e há organizações e manifestações importantes dos operários que não têm documentos.

Os operários sem-documentos têm peso numa nova política?
Badiou: Eles têm formas de organização, de manifestação e de resistência importantes. São os mais perseguidos de todos. O grande problema, um problema político maior para a organização de todas as forças políticas contra Sarkozy, é o da unidade entre essas quatro forças, de passagem de uma força a outra. No momento, elas estão separadas e, enquanto for assim, o adversário terá uma margem de manobra importante.

Os sindicatos são fracos e divididos?
Badiou: Exatamente. E, além disso, representam tradicionalmente uma força secundária, não decidem os acontecimentos. Maio de 68 não foi exatamente um acontecimento sindical. Mesmo a greve não foi iniciada sob comando dos sindicatos, ela começou antes. É chocante ver que entre os levantes da juventude popular e as manifestações e greves dos estudantes não há uma relação, ou então ver que a greve dos assalariados e os protestos dos trabalhadores de origem estrangeira também não têm unidade. Enquanto persistirem essas divisões, seremos fracos. Concretamente, o problema de organização política hoje é o problema de um mínimo de circulação e de unidade dessas quatro forças.

Qual seria a solução para uni-las?
Badiou: Será preciso começar por experiências locais. A possibilidade para os jovens intelectuais de trabalhar com operários de origem estrangeira sobre a questão dos documentos já existe, não é uma coisa impossível. Que a juventude popular seja apoiada ou considerada pela juventude estudante também é uma possibilidade. Podem-se construir pequenas experiências e tentar generalizá-las depois. Esse é o verdadeiro trabalho político.

Entrevista publicada na revista TROPICO em 23/2/2008
Leneide Duarte-Plon
É jornalista e vive em Paris.

Um comentário:

Heliete Vaitsman disse...

Altamente esclarecedor!!! Leneide, continue a nos informar assim.