sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Puisque nous sommes nés

É política e é arte o cinema de Jean-Pierre Duret e Andrea Santana, um casal de documentaristas (ele francês, ela brasileira) que criou uma linguagem própria ao contar histórias a partir dos diálogos e das imagens da vida real de seus personagens, colhidos por uma câmera discreta e respeitosa, no cotidiano de alguns dos mais pobres nordestinos.
“Puisque nous sommes nés” se passa em São Caetano, em Pernambuco, e é o terceiro filme que os cineastas fizeram no nordeste brasileiro. O documentário estreou na quarta-feira, 4 de fevereiro, em seis cinemas parisienses e diversos cinemas de toda a França, com grande cobertura na imprensa graças ao patrocínio de um padrinho de peso, o ator Jamel Debbouze, que resolveu co-produzir o filme ao descobri-lo já em fase de montagem. Até o telejornal mais visto do país falou do documentário esta semana.
Os críticos do “Le Monde” e do “Libération” não pouparam elogios ao filme que em 1h30 através de dois meninos pernambucanos, Nego e Cocada, nos mostra um microcosmo da miséria que é brasileira mas é também universal. Duret e Santana revelam a força que pode ter o documentário sem texto e sem a intenção de induzir o espectador nos caminhos de uma tese. Os personagens conversam entre eles enquanto a câmera os segue, mostrando o ambiente de miséria, não desprovida de dignidade, dos marginalizados que se recusam, como os dois adolescentes Nego e Cocada, a se tornarem “marginais” no sentido policial do termo.
Como nos dois documentários anteriores “Le rêve de São Paulo” (2004) e “Romances de terre et d’eau” (2002), as imagens são de tal forma fortes e eloqüentes que valem mais que mil discursos políticos de denúncia da exclusão.
Duret explica que seu filme conta uma história universal de dois meninos que procuram um lugar num mundo de adultos e sabem que onde nasceram não existe futuro. “O surpreendente e emocionante em Nego e Cocada é a energia que eles gastam para escapar ao seus destinos”, resume o cineasta.
Imperdível.

Je veux voir

Catherine Deneuve é ela mesma, a atriz feita de inteligência e sensibilidade, sempre bela, no documentário “Je veux voir”, de Joana Hadjithomas e Khalil Joreige. Deneuve emprestou seu nome e sua presença, generosamente, a um filme que mostra o Líbano devastado pelas bombas israelenses contra o Hezbollah, em 2006. E no qual ela se desloca como espectadora de cenas de pós-guerra.
O filme começa com a atriz dizendo que aceita o convite dos cineastas de ir ver o resultado da guerra. A destruição é mostrada pela câmera enquanto a atriz percorre estradas num carro com o ator libanês Rabih Mroué: aldeias destruídas e abandonadas pelo êxodo de populações, arames farpados separando a fronteira do sul do Líbano do norte Israel. O pós-guerra é mostrado em imagens de destruição enquanto vemos os olhos de Deneuve descobrir, ao mesmo tempo que os cineastas, um país devastado. A atriz quase não fala. Ela olha. Ela quer ver.
“Eu sabia pouca coisa, apenas que íamos ao Sul até a fronteira. Quando eu digo “bom dia” a Rabih no filme pela primeira vez era realmente a primeira vez que nos víamos. O que acontece no carro e durante a viagem não estava escrito”, contou Deneuve.
Evitando a narração, os cineastas optam pela sobriedade e pelo silêncio.
Um documentário feito de imagens fortes de um país recém- saído da guerra e de uma presença como a de Deneuve só pode resultar num filme excelente.

Picasso 24h

O Grand Palais inaugurou um horário novo na exposição “Picasso et les maîtres” que foi vista por 750 mil pessoas.
Neste último fim de semana, o museu ficou aberto 48 horas seguidas. Nem as temperaturas abaixo de zero desanimaram os visitantes que fizeram filas enormes num frio siberiano. Como a carteira de jornalista me dá direito de não fazer fila (além de não pagar) voltei ao Grand Palais no sábado depois do teatro, desta vez com meu marido que ainda não vira a exposição. Saímos do museu depois de meia noite e a fila não parava de crescer. Na saída das boates, Picasso foi o programa dos jovens que não queriam se arriscar a perder uma das maiores exposições dos últimos anos.
Inaugurada no ano passado, a exposição reuniu 210 obras de Picasso além de quadros de Manet, Velasquez, Goya, Rembrandt, Zubarán, El Grecco e Ingres entre outros mestres do genial espanhol.
Na minha primeira ida à exposição Picasso em dezembro dei de cara com Fernando Henrique Cardoso, que seguia um casal de amigos. Ele entrava e eu saía. Nenhum dos fãs de Picasso sabia que por ali passava o “príncipe dos sociólogos brasileiros”, responsável pela venda de empresas nacionais no carnaval das privatizações.
Única pessoa a saber quem era aquele personagem anônimo, além de minha filha que me chamou a atenção, tive vontade de tomar um alka-seltzer para me curar da azia que tomou conta de mim.

Um comentário:

Patrícia Morais disse...

Fiquei curiosa com o "Puisque nous sommes nés", encontrei o website, porém não há nenhuma menção sobre estréia no Brasil, que lástima.