sábado, 7 de março de 2009

Padrastos, madrastas e dor de cotovelo

No ano passado, o presidente Sarkozy encomendou um texto de lei, divulgado este mês, para fixar direitos dos padrastos e madrastas (beaux-parents) em relação aos filhos do companheiro ou cônjuge.
O texto do ante-projeto de lei chamado “Statut des beaux-parents” acabou, segundo o desejo do presidente, estendendo direitos aos homossexuais, permitindo que o companheiro de um gay ou a companheira de uma lésbica possam participar da educação do filho do outro. A lei foi apresentada como o primeiro passo para o reconhecimento da “homoparentalidade” (homopaternidade e homomaternidade) e à adoção por casais homossexuais.
Até hoje, a lei não reconhecia senão ao pai e à mãe o direito a cuidar da criança ou a acompanhá-la à escola ou ao médico. Agora, os padrastos e madrastas (heterossexuais ou homossexuais) terão os mesmos direitos em relação aos filhos biológicos do companheiro, companheira ou do cônjuge.
O casal presidencial vai ser diretamente atingido pela lei pois tanto Sarkozy quanto Carla Bruni têm filhos menores de relações anteriores. Ele fora casado duas vezes e tem um filho menor do segundo casamento com Cécilia Sarkozy. Carla tem um filho pequeno de Raphaël Enthoven, com quem viveu maritalmente. Raphaël era marido da filha do filósofo Bernard-Henri Lévy quando ele e Carla se conheceram. Carla vivia com o pai de Raphaël, Jean-Paul Enthoven.
Justine Lévy aproveitou a experiência amarga de mulher abandonada para escrever o romance “Rien de grave”. Nessa obra de auto-fiction, que vendeu quase 200 mil exemplares, ela não poupa sua rival. Carla (com outro nome, claro) é uma devoradora de homens, calculista, cujo rosto foi todo reconstruído pela cirurgia plástica. Realidade ou ficção ? De qualquer forma, a vingança pública teve diversas traduções pelo mundo e recebeu dois prêmios literários.

Mademoiselle ou Madame?

É difícil acreditar mas até 1938, um ano antes da segunda guerra, as francesas não podiam pedir um passaporte ou abrir uma conta bancária sem a autorização do marido. E até 1965 (!) o marido tinha o direito de se opor ao trabalho da mulher fora do lar. O código civil de 1804 (de Napoleão), que se manteve quase intacto até pouco tempo, fazia das mulheres francesas menores do ponto de vista legal.
Hoje, liberadas e donas de seu destino, as mulheres francesas têm filhos sem passar necessariamente pelo casamento: quase a metade (48,3%) das crianças nascem fora da instituição do casamento.
Mas apesar desses avanços, a sociedade francesa convive com vestígios da sociedade patriarcal, como no uso das palavras Madame ou Mademoiselle, impressas em cheques ou mesmo em formulários diversos, que designam se uma mulher é casada ou não. Ou seja, se ela tem um dono ou não. Nada indigna mais as associações feministas que esses resquícios de machismo incorporados à língua e aos costumes.
No Canadá, a instituição que legisla sobre a língua francesa estabeleceu o uso de “Madame” a todas as mulheres, menos as que são muito jovens e às solteiras que fizerem questão do “Mademoiselle”. Essas são cada vez mais raras. Nos formulários canadenses, existe apenas “monsieur” ou “madame”. Dessa forma, dissocia-se o tratamento a uma mulher do fato de ser solteira, casada, divorciada ou cônjuge de fato numa relação de casal sem casamento.

Assassino homenageado no Parlamento francês

O combate pela igualdade entre homens e mulheres é uma luta apenas das mulheres?
Quantos homens se preocupam em se engajar na luta pelos direitos iguais no trabalho, na vida familiar, na vida afetiva? Quantos são capazes de sair de casa para ir a uma passeata contra as violências físicas feitas às mulheres?
No final de 2008, um deputado francês casado espancou sua jovem amante, matou-a e se suicidou. Seus colegas na Câmara observaram o tradicional minuto de silêncio em sua memória. Em artigo sobre a atualidade do feminismo publicado esta semana, a escritora e feminista Benoîte Grout pergunta: “Se houvesse 50% de mulheres no Parlamento francês, os parlamentares teriam tido a coragem de honrar a memória daquele criminoso?”
Benoîte Groult, que tem uma vasta obra de romances e ensaios, foi a presidente da comissão criada no governo Mitterrand para introduzir na língua francesa femininos para atividades que eram designadas apenas no masculino como auteur (auteure) e écrivain (écrivaine).
Em 1986, ela publicou pela primeira vez integralmente a Declaração dos direitos da mulher e da cidadã, de 1791, redigida por Olympe de Gouges.

Um comentário:

Patrícia Morais disse...
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