domingo, 15 de setembro de 2013

Que venham os sírios ?

O jornal Le Monde de 12 de setembro publicou publicidade de página inteira sem fotos, cujo título, em corpo gigantesco, dizia : « A França deve acolher os refugiados sírios. »
O texto lembra que o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (HCR) fez um apelo à União Européia para que acolha parte dos dois milhões de refugiados sírios instalados temporariamente nos países limítrofes (Turquia, Líbano, Jordânia e Iraque).
Segundo o texto, a França, contrariamente a outros Estados europeus, não respondeu ao apelo. Em vez disso, tem dificultado o trânsito desses refugiados em direção a outros países da UE. As ONG que assinam a publicidade (Anistia Internacional, Cimade, Médecins sans frontières, Secours Catholique e Secours Islamique) fazem um apelo ao presidente da República pela criação de uma política de acolhida àqueles refugiados.
Essas associações humanitárias se comprometem a usar toda a infra-estrutura de que dispõem para ajudá-los, assim como mobilizar a sociedade francesa.
Mas, pelo visto, os sobreviventes dos massacres dos dois últimos anos não interessam à França, que como todos sabem é o “pays des droits de l’homme” e se vangloria de ser uma “terre d’accueil”.
Tudo que interessava a Hollande antes do acordo russo-americano era mandar seus militares à Síria “punir” Bachar. Provando que a "comunidade internacional" é uma ficção, russos e americanos se reuniram e decidiram sozinhos os próximos passos da guerra na Síria. 

Papai Bush não quis "punir" Saddam Hussein

O diretor de pesquisas do CNRS e especialista em Iraque e em Oriente Médio, Pierre-Jean Luizard relembra em entrevista ao L’Humanité que Saddam Hussein usou gases contra os kurdos na guerra Irã-Iraque, em 1988. O Senado americano tentou votar sanções econômicas contra o Iraque para “punir” o regime pelo fato de utilizar gaz contra seus próprios cidadãos. O então presidente Bush (pai) vetou qualquer tipo de sanção ao Iraque, em guerra contra a jovem república islâmica do Irã. 
Só mais tarde, Saddam Hussein se transformou no inimigo que deveria cair. Quem será o próximo? Depois de Bachar,  o Irã?
Em seguida, segundo analistas do Pentágono, será a vez de enfrentar a China. Um mundo sem guerras somente depois que o homo sapiens desaparecer do planeta.

Kissinger e Nixon : terrorismo de Estado

O 11 de setembro chileno foi decidido por dois terroristas que nunca foram punidos: Henry Kissinger e Richard Nixon. O embaixador dos EUA no Chile contou ao cineasta Patricio Guzman, autor do extraordinário documentário Allende que os dois citados indivíduos chamaram-no para dizer que aquele sob (son of a b....) não podia continuar prejudicando os interesses dos EUA. Pinochet fez o trabalho sujo para eles.
O correspondente do jornal Le Monde em Santiago durante o governo Allende, Pierre Kalfon, contou em longa entrevista ao jornal como teve de deixar o Chile em 48 horas. Ele rememorou os momentos mais dramáticos que se seguiram ao golpe. Uma pequena anedota: ao invadirem o apartamento do jornalista, soldados armados até os dentes fizeram apreensões de fitas, livros e documentos. Um dos livros, sobre o cubismo, foi levado por pensarem que se tratava de Cuba.
Segundo o Le Monde, 75% dos chilenos pensam que os vestígios da ditadura continuam presentes. Se fizéssemos uma pesquisa no Brasil o que teríamos? A Comissão Nacional da Verdade, instalada com grande dificuldade no Brasil, vai conseguir fazer seu trabalho em profundidade?
Em entrevista de página inteira ao jornal Le Monde, o cineasta chileno Patrício Guzman, autor dos documentários Allende, O caso Pinochet e A batalha do Chile, entre outros, lemba que durante a era Allende 70% das rádios e dos jornais faziam oposição ao goverrno. 
“Seu socialismo era tolerante e libertário”, diz Guzman (Foto em sua casa em Paris). 

Ele lamenta que no Chile nunca tenha havido uma verdadeira reflexão nacional, como  na Argentina. “Os escritores, os cineastas, os historiadores trabalham esse passado, mas quantos chilenos têm acesso a essas obras?”, pergunta. Segundo ele, sem a experiência de Allende, que renovou a esquerda latinoamericana, não existiriam hoje os governos progressistas da América do Sul.
Quem quiser ler documentos secretos já desclassificados sobre o golpe no chile pode clicar no link. Os comentários são em francês:

Nos passos de Frei Tito de Alencar

 As entrevistas para a biografia de Frei Tito de Alencar Lima me levaram a encontrar pessoas extraordinárias, entre elas, alguns frades dominicanos franceses, hoje octogenários, que conviveram com o frade brasileiro em seu exílio francês.

Nos passos de Frei Tito, fui parar no cemitério de Ferrara, na Itália, onde visitei túmulos à procura dos familiares de Carlos Marighella, criador da Ação Libertadora Nacional, na qual alguns frades dominicanos militaram. O pai de Carlos, Augusto Marighella, emigrou ao Brasil no início do século XX, se estabeleceu na Bahia e fundou família.
Alguns dos Marighella  de Ferrara, parentes do nosso líder revolucionário, repousam no maravilhoso cemitério da cidade, de uma beleza que lembra os conventos medievais. 

Outros Marighella de Ferrara têm seus nomes no catálogo telefônico da cidade. (Para ver a foto ampliada basta clicar sobre ela). 

Ainda nos passos de Frei Tito, fizemos, Clarisse Meireles e eu, diversas entrevistas com revolucionários brasileiros, que participaram das lutas estudantis e da resistência à ditadura, inclusive na luta armada.
Um deles, Luiz Eduardo Prado de Oliveira, conseguiu escapar ao cerco das prisões que se seguiram ao sequestro do embaixador americano, em setembro de 1969. Exilado na Europa, Prado de Oliveira vive até hoje em Paris, onde trabalha como psicanalista.
Num texto notável sobre a tortura, intitulado De la torture, de l’exil et du génocide (Da tortura, do exílio e do genocídio) Luiz Eduardo Prado de Oliveira observa, en passant, a propósito da Rede Globo :
“São a televisão e a imprensa – no Brasil, a formidável máquina de destruição do imaginário de um povo e de suas capacidades de sublimação que representa a Rede Globo, verdadeira máquina de tortura mental generalizada – que têm a carga particular de distorcer e deformar o pensamento e a linguagem.”
Como não pensar nesse texto ao ler a notícia do “mea culpa” feito pela Rede Globo? Os cúmplices da ditadura são também responsáveis pelos mortos, pelos torturados, pelos desaparecidos. Além de participarem até hoje do projeto de distorção do pensamento e da linguagem.

Il maestro terá museu em Ferrara

A cidade de  Ferrara organizou de março a junho deste ano uma maravilhosa exposição homenageando o cineasta Michelangelo Antonioni no Palazzo dei Diamanti. O cineasta deixou para sua cidade natal mais de 40 mil documentos, quadros, cartas, filmes, roteiros. Parte desse enorme acervo Antonioni foi exposto este ano, preparando a abertura no ano que vem de um museu na cidade exclusivamente dedicado ao genial cineasta que alguns de seus pares chamavam carinhosamente de “Il maestro”.  

Entre as cartas ao “maestro”, se destacam as de grandes atores e diretores do cinema mundial. Sobre Antonioni, Fellini escreveu : “Profissão reporter” é o mais completo, o mais puro, o mais essencial dos filmes já realizados pelo cineasta de Ferrara, um filme crudelíssimo, cirúrgico e ao mesmo tempo dulcíssimo”.
“Il maestro” foi definido por Martin Scorsese como “um dos maiores artistas do século XX, um poeta do nosso mundo que se transforma.”

França: telefones celulares e i-pads proibidos aos ministros

O governo francês recomendou esta semana a seus ministros que não usem seus telefones celulares para assuntos considerados importantes e  sensíveis. O efeito Snowden começa a se fazer sentir também na França. A proibição diz respeito aos smart phones e i-pads, que não dispõem de dispositivos de segurança garantidos pelo órgão francês de segurança informática. As informações confidenciais devem passar por telefones especiais e pelo intranet interministerial.
Entre as recomendações, o governo alerta para as viagens no estrangeiro. Nesse caso, todo cuidado é pouco. Nada de telefonar de organismos internacionais, hoteis, restaurantes. Cyber-cafés não são dignos de confiança. Nunca deixar o computador ou mesmo o telefone celular dentro do cofre do quarto do hotel, recomenda o governo.
Nos próximos dias, novas diretrizes serão dadas para completar as medidas de segurança do governo.
O Brasil, o mais visado pela espionagem americana, continua vulnerável. Será que governos como o da França vão conseguir neutralizar o Big Brother?

Morte em Veneza

Estávamos de férias na Itália, em agosto, quando ocorreu o primeiro acidente com vítima fatal no Canal Grande, de Veneza, consequência do choque entre uma gôndola e um vaporetto. Quem garante que esse foi o primeiro acidente com morte é o jornal de esquerda La Repubblica. Foi de manhã, perto da ponte de Rialto. No choque, um casal de alemães que estava na gôndola com dois filhos caiu na água. O pai conseguiu salvar a família mas foi ferido mortalmente pelo vaporetto.
O jornal La Repubblica registrou o acidente em uma página. O texto ressalta a necessidade de frear o incessante aumento de turistas que invadem Veneza, sobretudo em ano de Bienal de arte, como este.


No pico do verão europeu, o mês de agosto torna as ruas de Veneza um verdadeiro formigueiro de turistas, que vêm, na maioria das vezes, por um dia apenas. Eles saem dos navios de cruzeiros, verdadeiros monstros que ficam ancorados não muito longe da cidade. O movimeto das águas provocado pelos mastodontes na laguna  é o bastante para ameaçar todo o  ecossistema e fazer tremer os alicerces da basílica de San Marco.
Durante o dia, esses monstros despejam milhares de turistas que se precipitam para a Piazza San Marco e outros pontos turísticos. À noite, os habitantes da Sereníssima reencontram  a paz e o silêncio que perdem durante o dia. Mas a infra-estrutura da cidade sofre danos gravíssimos.
Quando vemos o Canal Grande engarrafado de táxis, vaporettos e gôndolas nos dizemos que é um verdadeiro milagre a ausência de acidentes.
Vai ver, Deus é veneziano.
Pausa para um SMS que ninguém é de ferro ...
(FOTOS DE LENEIDE DUARTE-PLON)

Uma morte bem-sucedida

Essa é a atual ambição de Jean-Louis Trintignant, o genial ator francês de Amour, de Michael Haneke. Entrevistado por uma revista francesa, o ator disse que Amour foi seu último filme e agora só espera a morte. Não tem nenhuma ambição.
“Vou tentar ter uma morte bem-sucedida, morrer com saúde e não cheio de tubos num hospital. Se isso for irreversível, não vale a pena esperar”.
Ele conta que não foi por pudor que recusou o convite de Bertolucci para protagonizar o filme “O último tango em Paris”. Foi a pedido de sua filha Marie, então com 12 anos. Ela lhe pediu que não fizesse o filme  ao ler o roteiro.
Marie não queria que na escola todo mundo lhe falasse do pênis de seu pai. Foi para protegê-la que Trintignant recusou, mesmo tendo trabalhado com Bertolucci na elaboração do roteiro do filme.

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